Há muito tempo, o casamento deixou de ser o único caminho para casais que decidem construir uma vida a dois. Com a evolução dos costumes, surgem também novas necessidades de proteção legal, e é nesse contexto que a união estável se torna fundamental para evitar problemas futuros, especialmente no planejamento patrimonial e sucessório.
Regulamentada pela Constituição de 1988, a união estável formaliza uma situação de fato, reconhecendo legalmente a entidade familiar. Luiz Kignel, advogado especialista em direito de família, nota que "o direito de família, diferentemente das outras áreas, não inventa, mas sim reconhece situações que a sociedade passa a aceitar com o tempo". Vamos detalhar os principais pontos sobre o tema.
O que é Preciso para Configurar uma União Estável?
Para que a lei reconheça uma relação como união estável, quatro elementos são essenciais: ela deve ser pública (o casal se apresenta como tal à sociedade), contínua (sem interrupções constantes), duradoura e ter a intenção de formar uma família.
Não há mais um tempo mínimo de convivência exigido, e o casal nem precisa morar sob o mesmo teto. Um fator determinante, segundo o advogado Luiz Kignel, é a dependência financeira entre os parceiros. "Muitas pessoas assinam um 'contrato de namoro' para evitar as consequências da união estável. No entanto, se houver dependência financeira de um pelo outro, esse contrato perde a validade", explica.
Qual o Estado Civil na União Estável?
A união estável não muda o estado civil. Quem é solteiro, divorciado ou viúvo continua com essa designação em seus documentos. Legalmente, os parceiros são chamados de "companheiros" ou "conviventes".
Como Funciona a Divisão de Bens?
A união estável adota os mesmos regimes de bens do casamento. A escolha do regime é um ponto crucial.
- Comunhão Parcial de Bens (Regra Padrão): Se o casal não fizer um contrato especificando o regime, este é o que vale automaticamente. Nele, apenas os bens adquiridos de forma onerosa (comprados) durante a união são considerados patrimônio comum e divididos em caso de separação. Bens recebidos por herança ou doação por apenas um dos parceiros não entram na partilha.
- Comunhão Universal de Bens: Todos os bens, adquiridos antes ou durante a união (incluindo heranças e doações), tornam-se um patrimônio único do casal, a ser dividido 50/50 em caso de término.
- Separação de Bens: Cada um mantém seu patrimônio individual. Não há bens comuns, a não ser que decidam comprar algo juntos, registrando na escritura a porcentagem de cada um na aquisição.
União Estável vs. Casamento: Qual a real diferença?
A principal diferença é a formalidade. O casamento é um ato solene, burocrático, que exige a presença de um juiz. Já a união estável pode existir sem nenhum documento, sendo reconhecida pelos fatos da vida a dois.
Em termos de direitos e deveres (divisão de bens, herança, pensão por morte), não há diferença. Um companheiro pode, inclusive, adotar o sobrenome do outro. O desafio da união estável não formalizada é provar quando ela começou. Desde uma decisão do STJ em 2021, não é mais possível firmar um contrato de união estável com data retroativa; o acordo só vale a partir da assinatura.
Como Provar que a União Estável Existe?
Sem um registro em cartório, a comprovação pode ser feita por meio de: testemunhas, fotos e publicações em redes sociais, contas bancárias conjuntas, apólices de seguro com o parceiro como dependente, comprovante de mesmo endereço, certidão de nascimento de filhos em comum, entre outros documentos que demonstrem a vida em comum.
E a Herança, Como Fica?
Na sucessão, a união estável é igual ao casamento. O direito do companheiro sobrevivente dependerá do regime de bens:
- Comunhão Parcial: O parceiro sobrevivente é meeiro (dono de 50%) dos bens comuns (adquiridos durante a união) e herdeiro dos bens particulares (que o falecido já tinha antes da união), concorrendo com outros herdeiros, se houver.
- Comunhão Universal: O sobrevivente é apenas meeiro, recebendo metade de todo o patrimônio. A outra metade vai para os herdeiros (filhos, pais, etc.).
- Separação Convencional de Bens: O parceiro sobrevivente é considerado herdeiro dos bens do falecido. Na separação obrigatória (ex: um dos parceiros tem mais de 70 anos), ele não herda, salvo se comprovar que contribuiu para a aquisição dos bens.
Como Formalizar ou Dissolver a União?
- Para formalizar: Pode-se fazer uma escritura pública em um cartório de notas (mais segura) ou um contrato particular registrado em cartório de títulos e documentos.
- Para dissolver: Se for amigável e não houver filhos menores ou incapazes, a dissolução pode ser feita diretamente no cartório (extrajudicial). Caso contrário, se houver disputas ou filhos menores, o processo deve ser judicial, com a necessidade de advogados.